RESPIRAR

 

Não vemos a mesma paisagem

Já olhaste as ilhas aí em frente?

Por que olhas somente o que é teu?

Se sentisses como é habitado o espaço

E como nada pertence a ninguém ...

Quando foi que nos conhecemos?

Serás mesmo a procurada?

Por que te chamo?

Nada desejo.

Olha bem e respira

Pensa, se houvesse dificuldade

Pelo custo alto, em respirar, seria espantoso.

 

Poeira de terra morta brinca com o vento

Mulher com filhos embrulhados, ficaram

Na estrada, espiando por todos os lados, não vendo

Nem rastro dos outros, permaneceram ao lado da cova do chefe que enterraram

 

O filho menor está morrendo

As filhas maiores soluçam forte

Caem lágrimas de pedra. Mãe querendo

Levar menino morto: feio de sofrer, cara da morte

 

Desolação. Silêncio apavorando

Solo sem fim pegando fogo.

Não há direção. O sol queimando

Embrutece. Cabeça vazia de bobo

 

Há quanto tempo? Famintos e sem sorte

A água pouca, ninguém pede nem faz menção

Água, água, se acabar, vem a morte.

Estão irrigando a terra? É barulho de água? Alucinação

 

Que Santo nos poderia livrar?

Reza de velho louco

Deus pode a todos castigar.

Que é que esse menino tem? Está morto.

 

Corri muitos caminhos, vi muitas

Madrugadas estive dentro do fogo

Amanheci dormindo nas águas dos rios

Tudo par encontrar qualquer

 

Coisa branca. Existirá mesmo?

Andei andei até o céu. Perguntei

A todas as estrelas sem resultado

Estaria desejando o branco ou a luz?

 

Confuso ancorei aqui em frente

Ao mar. Não saí mais e não interroguei

Esqueci e a memória acabou

O que vejo não sei o nome

 

Vazio, poderia dobrar-me como

Folha de papel e caberia em

Meu bolso. Nem medo e nem coragem

Solidão completa ...

 

Procurando nas colinas e nos brejos

Nas ruas e nas cadeias, no manicômio

E nos teatros nos jogos de futebol

E nos conventos.

 

Achei? Já não lembro. Alguma

Coisa branca e transparente?

Corri muito atrás de quinta-feira

Inutilmente. Mergulhei na areia

 

E desci de pára-quedas.

Em terra surgi como espantalho

Confundi tudo e esqueci. De que

Andava em busca? Carreguei pedras

 

E apanhei café. Montei a cavalo em pêlo

Sempre buscando, buscando.

Seria o Farol no meio do mar?

Olhando a lua distingo uns cabelos de ouro

Quem será  namorada dos mais pobres do mundo?

Os desprezados? Amando

Sozinhos. Haverá

Alguém sabendo o que procura?

 

A lua não é mais a donzela

Amada pelos namorados, São Jorge

Retirou-se para

Outros mundos. Mesmo violentada

 

Continuará distribuindo poesia –

Aluminando as estradas para os

Viajantes. O Sol permanece

Fornecendo-lhe luz ...

 

Acontecimentos do Sputnik teriam

Modificado o céu? E nós seremos

Os mesmos? Ao próximo foguete

Pedirei notícias de meus amigos mortos

 

Se a coragem estivesse dentro

De mim viajaria para lá

Os meu medos espantam

Qualquer intrepidez

 

Prisioneiro do silêncio e parado

Espio as sombras se arrastarem

Homens rudes e outros frágeis

Carregando nos ombros o volume

Pesado deste mundo. Da grande fila

 

Não se vê o começo e nem o fim

Imploro uma brecha – Ninguém

Me dá atenção teriam ensurdecido?

Ou talvez não tenham olhos.

Cada um joga no futuro, mesmo

No fim. A miragem não vive

 

Só no deserto. Todas as criaturas

Têm reservatórios

A loucura não está com elas

São enfermos da tristeza sem

Suspeitarem. Do lado de fora

Tenho a alvorada e o verão

Fazendo-me companhia

Não consigo sair do lugar

 

As areias do mar contam-me

Histórias dos navegantes e o

Silêncio das águas

Andei pelas estradas em

Fim pisei nos pedregulhos

Estive no buracão vendo o moinho de fubá, as água

 

Aflitas eram estranguladas

Sob a roda de mover

Passavam e nunca mais voltavam

Para onde iriam e onde estarão?

 

Sabemos tão pouco, nem de suas

Idades suspeitamos, quais serão as

Suas transformações? Pouca água

Há ali é distribuída entre os

 

Córregos. As nuvens de chuvas as

Deixavam correndo correndo

Sempre. O vento passava sem lhes

Dar atenção. Os seixos pouco avançavam como paralíticos.

 

Às vezes rasgando um pedaço de papel, assustado

Detenho-me e indago: ele sentirá dor? ...

 

Onde estão as flores? deste-me

Uma braçada, mas não as encontro

Feridas estão minhas mãos pelos

Espinhos – mas onde estão as

Flores? Meus dedos sangram

Não quero mais nada de ti

Vives me machucando ...

Separada. Não

Suspeitas haver um mundo lutando?

E flores do campo. Não te

Aproximes delas – sofreriam

com teu olhar ...

Não as toque nunca.

 

Acossado e perseguido pelas longas sombras

Projetadas sobre mim

Como em noite escura, as luzes redondas

Dos holofotes extensos e sem fim

 

As sombras vindas de todos os lados

Cercavam-me às vezes

A ânsia de fugir vendo homens apressados

Estendia para cima meus braços de luzes

 

O silêncio acompanhava o escuro

O fogo e a brisa ondulavam

Ao meu redor machucavam-me duro

E com seus movimentos metralhavam

 

Pouca oportunidade de fugir: em vertical, com medo

Imenso que me entupia; enxergava

Já não podia multiplicar o desejo

Fechei dentro de mim o que transbordava.